"Hoje sou um sem-teto", afirma Silva, de 47 anos, desempregado. Há quatro meses, ele passa as noites na Rodoviária Novo Rio, dormindo em um banco no segundo andar, usando a mochila como travesseiro. Quando consegue dinheiro de amigos solidários, dorme em uma pensão.
Silva toma os medicamentos antirretrovirais todos os dias, religiosamente, mesmo que não tenha o que comer. O coquetel vem ajudando a controlar o HIV, mas o tratamento médico não mata a sua fome. Sua única renda fixa são R$ 70 que recebe do Bolsa Família.
Silva é um exemplo de como o programa brasileiro para pessoas com HIV no Brasil, que inovou no passado ao determinar a oferta universal da terapia antirretroviral, hoje precisa de mais que remédio.
Ele não tem família e depende da solidariedade de amigos e da ajuda de ativistas de ONGs onde milita. A incerteza sobre o teto se arrasta desde que soube da doença. Morava com a namorada, mas ela pediu que saísse de casa um dia após saber do diagnóstico.
Coordenadora de um programa educativo no Grupo Pela Vidda, Mara Moreira afirma que há um aumento de pessoas que chegam à ONG com demandas de cunho social.
Há muitos casos de pessoas que recebem alta do programa de Previdência Social, deixam de receber o benefício, mas não conseguem emprego, diz.
"A epidemia mudou de perfil e hoje está atingindo pessoas mais pobres. Temos recebido várias demandas na área de assistência social, com pessoas que precisam de recursos financeiros e de condições de sobrevivência mínima, mas não temos a quem recorrer", diz Mara, que tentou buscar apoio na Secretaria Municipal de Assistência Social, mas foi encaminhada de volta à Secretaria de Saúde.
Ela ressalta que a terapia antirretroviral exige que as pessoas se alimentem bem, e alguns medicamentos precisam ser mantidos na geladeira. "E aí as pessoas estão dormindo na rua. Como fazer?"
Para o psicólogo Veriano Terto Júnior, coordenador-geral da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), faltam medidas para além do fornecimento de antirretrovirais.
"O Brasil tem acesso universal (ao tratamento). Esse é o nosso grande resultado", diz. "Mas infelizmente começamos a ver um novo crescimento da taxa de mortalidade em alguns lugares, o que está menos relacionado à Aids em si do que a deficiências na assistência."
No ano passado, 11 mil pessoas morreram por causa da Aids no Brasil. No Rio, o ritmo de óbitos vem aumentando desde 2007, diz Terto. "Isso é inaceitável para um país que tem acesso universal ao medicamento."
Apesar de ser bem articulado, Silva tem pouca esperança de conseguir um emprego. A última vez que tentou foi em uma empresa de ônibus do Rio que anunciara vagas para pessoas com necessidades especiais.
"O médico perguntou qual era a minha deficiência. Quando respondi, ele rasgou a minha ficha e disse que não contratavam soropositivos", lembra.
Ele diz querer um emprego, mas duvida que encontre um empregador que preencha seus requisitos. "Os patrões têm que entender que a cada três meses vou ter que me ausentar para ir ao médico, e que de vez em quando vou chegar atrasado."
Ele defende que pessoas em sua situação sejam beneficiadas por uma política de segurança nutricional, de moradia e de assistência pecuniária. "Eu não vou viver só de antirretroviral. Tenho que me alimentar."
Fonte;
BBC
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